sexta-feira, 9 de julho de 2010

Post Gigante - parte 2

Continuando na escrita obsessiva pouco-original, mas confortável.

Frotté [6] propõe rupturas na orientação vocacional – não no sentido de propor um modelo novo, mas no anúncio de outras possibilidades de vivenciar a escolha profissional. Sua proposta - assim como a da disciplina de um modo geral - é complicada de se entender, porque os meios, o processo, são postos em cena como atores principais, quando estamos acostumados a tê-los como coadjuvantes. A prática da orientação vocacional acostumou-se a dar respostas, a dizer “é isso!”, o que dá certo lugar para a inquietação adolescente de saber o que fazer enquanto profissão pelo resto da vida. Quando a proposta é dar ênfase ao processo de escolha, e não à escolha em si, como resultado certo, um estranhamento é sentido quase que imediatamente. Seguindo o questionamento que a autora traz: “como produzir um desmantelamento de modos de viver tão contidos em seus projetos e sonhos e propor um convite ao estranhamento, ao olhar curioso, compondo outros mapas de vida?”. Chega a ser algo frustrante – quase sádico – responder a uma pergunta com milhões de outras que acabam mais por confundir do que outra coisa.

Eu tô te explicando
Prá te confundir
Eu tô te confundindo
Prá te esclarecer
Tô iluminado
Prá poder cegar
Tô ficando cego
Prá poder guiar

Tô com Tom Zé. Quem somos nós para dar respostas?

Frotté vai trazer o pensamento de Castel acerca do desmantelamento da sociedade salarial. O contínuo “escolaridade, depois aprendizagem, casamento e entrada por quarenta anos numa vida profissional contínua, acompanhada de uma curta aposentadoria” foi abalado. As macro-mudanças nos desasseguram, pois nos lançam na incerteza. Não encontrar um emprego, não escolher bem a profissão, não ter dinheiro para viver bem, não ser feliz, não ter sucesso etc. são inseguranças que já passaram pela cabeça de cada um de nós. A orientação vocacional funcionava como resposta a muitas dessas questões. Mas o tipo de resposta pressupunha um tipo de sujeito desimplicado do seu papel de escolha. O resultado do exame determinava qual era a escolha certa e ponto final. A proposta que se faz é escapar desse modelo fechado, problematizá-lo, entender como ele se formou enquanto tal. O pensamento que na aparência é puramente destrutivo ganha um tom de reconstrução.

É aí que o pensamento de Barros [7] entra. Para que a transformação/reconstrução seja feita, é preciso apostar no coletivo, no grupo. Segundo ela, trata-se na aposta de uma clínica indissociável da política, tal como Abreu e Coimbra [5] sinalizaram. Barros diz que “Toda análise, toda clínica, é política, porque problematiza os lugares instituídos, as dicotomias naturalizadoras, porque pergunta sobre os modos de constituição das instituições”. E o grupo opera na fronteira entre a clínica e a política. O dispositivo grupal é tomado como jogo de forças micropolíticas, sempre longe do equilíbrio. Para se fazer pesquisa com esses grupos, é preciso um método diferente. Como coloca Rolnik [8], não se trabalha com objetos, mas com fluxo de forças. A instituição vai ser entendida enquanto coletivo de forças, e fazer pesquisa sobre isso é ter algo em constante movimento enquanto objeto. Nesse sentido, o que se faz é acompanhar processos, e não representar objetos. O método cartográfico proposto vem embasar a prática da análise do vocacional.

A falta de tempo me impede de continuar. Como fechamento, deixo registrado meu apreço pela matéria. Apesar de algumas vezes perder a paciência com algumas discussões sobre o mesmo ponto, foi realmente proveitosa a discussão. Recebemos um “convite ao estranhamento” no início desta disciplina. O convite foi aceito com prazer!


[6] FROTTÉ, M.D. Provocando rupturas na orientação vocacional. In: Analítica do vocacional: percursos e derivas de uma intervenção. Dissertação (Mestrado em Psicologia). UFF: 2001.
[7] BARROS, R.B.D. Introdução. In: Grupo: A Afirmação de um Simulacro. Porto Alegre: Editora UFRGS, 2007.
[8] ROLNIK, S. O Cartógrafo. In: Cartografia Sentimental: Transformações Contemporâneas do Desejo. São Paulo: Estação Liberdade, 1989.

André Luiz Vale

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