quinta-feira, 8 de julho de 2010

Repensando os processos de escolha

Antigamente era a família que decidia que profissão o jovem deveria seguir, dentro de uma gama relativamente restrita de profissões consideradas “tradicionais”. Hoje as pessoas não se contentam simplesmente com uma identidade que seja “legada” ou “herdada” a partir dos valores familiares. Cada vez mais temos que decidir quem somos, como agimos, e até mesmo como parecemos aos outros. Essa diversidade de opções enquanto ao poder ser representa, por um lado, uma forma importante de liberdade, por outro lado, torna o processo de constituição da identidade adolescente muito mais complexo, já que o adolescente encontra-se em permanente reconstrução interna e precisa de referenciais, modelos através dos quais ele possa posicionar-se. O que observo é que os adolescentes vem sendo bombardeados por uma enorme oferta de modelos de identidade rápidos e descartáveis, que não oferecem um norte realmente claro. Isso acontece também na questão profissional onde muitas vezes eles acabam sendo “seduzidos” por profissões da moda ou mais exploradas pela mídia. Esses fatores, juntamente com o excesso de informação e as exigências que os adolescentes percebem à respeito do mundo do trabalho fazem com que o adolescente muitas vezes estabeleça critérios de escolha mais voltados para referenciais externos que para seus interesses, anseios e aspirações. Hoje em dia é comum escutar adolescentes que digam que querem uma profissão que dê dinheiro, não importa qual seja. Essa questão precisa, portanto ser entendida sempre dentro do momento social que estamos atravessando e como Guattari nos propõe, o sujeito (sua subjetividade) é construído pelos diversos atravessamentos sociais.

Dessa forma, a análise do vocacional e a invenção de novos possíveis torna-se importante, enfatizando a construção de processos de escolha, escapando ao que já está construído, isto é, criando novas possibilidades de escolhas que até então estavam fora de questionamento. Analisar vocações é fazer com que o sujeito esteja ciente que critérios existem (ao escolher uma profissão para agradar a mãe ou então que dê dinheiro) e fazer com que este sujeito compreenda que esses critérios podem ser construídos, reconstruídos, pensados e repensados. Em suma, esse sujeito é formado por atravessamentos sociais, encontros que agenciam, são agenciamentos coletivos de enunciação. Não há um sujeito a priori, mas sim um sujeito no aqui e agora, atravessado e que modifica-se a todo momento.

Trabalhar a escolha por uma escolha. Escolhas estas implicadas em um pensamento que cria a diferença, pensamento este que coloca o processo de escolha em questão. Análise do vocacional, portanto, consiste em trabalhar o próprio sujetio que escolhe, que não é mais submetido aos processos de biopoder (ligado à serialização) e por isso enfatiza-se o trabalho de escolhas que inventem modos inéditos de existir. Enfim, trabalhar a restituição da capacidade de escolher, superando a idéia de que escolher pressupõe possibilidades que se excluem.


GUATTARI, F; ROLNIK, S. Micropolítica: cartografias do desejo. Petrópolis: Vozes, 2000, pp.33-61.

MACIEL JÚNIOR, A. O problema da escolha e os impasses da clínica na era do Biopoder.In: MACIEL JÚNIOR, A; KUPERMANN, D; TEDESCO, S. (Orgs.). Polifonias: Clínica, política e criação. Rio de Janeiro: Contra-capa, 2005.



Letícia Barros Cândido

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