terça-feira, 29 de junho de 2010

Ou isto ou aquilo

Ou se tem chuva e não se tem sol,
ou se tem sol e não se tem chuva!

Ou se calça a luva e não se põe o anel,
ou se põe o anel e não se calça a luva!

Quem sobe nos ares não fica no chão,
quem fica no chão não sobe nos ares.

É uma grande pena que não se possa
estar ao mesmo tempo nos dois lugares!

Ou guardo o dinheiro e não compro o doce,
ou compro o doce e gasto o dinheiro.

Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo...
e vivo escolhendo o dia inteiro!

Não sei se brinco, não sei se estudo,
se saio correndo ou fico tranqüilo.

Mas não consegui entender ainda
qual é melhor: se é isto ou aquilo.

Cecilia Meireles (Ou isto ou aquilo, Editora Nova Fronteira, 1990 - Rio de Janeiro, Brasil.)



Particularmente, eu considero fenomenal esse poema de Cecilia Meireles. Ele pode servir como uma ferramenta para questionar os processos de escolha.
Há dois pontos sobre ele que considero principais e gostaria de comentar aqui. Em primeiro lugar, ele tematiza diversas escolhas cotidianas, tais como comprar um doce ou economizar dinheiro, colocar luva ou não. Essa tematica traz à tona a existencia de uma necessidade constante de se escolher. Essa seria uma das poucas coisas que não escolhemos. Frente à vida, não há como não escolher nada. A não-escolha não é uma escolha possivel, está ai uma impedimento.
Em segundo lugar, ele delineia um processo de escolha que, obrigatoriamente realiza um duplo papel: por um lado, abre possibilidades de escolha, e, por outro, as encerra. Ou melhor, enquanto o processo de escolha cria possibilidades, ele também faz com que o sujeito, ao escolher uma dessas possibilidades, escolha simultaneamente a negação de todas as outras. Escolher um "sim" para algo, é escolher um "não" para diversas outras opções.

Essa é uma tematica que percorre as discussões sobre o escolher, e que considero importantissimas se queremos entrar no campo dos processos de escolha.

Veronica Gurgel

5 comentários:

  1. Nossa Veronica, adorei o poema. Não o conhecia e ele tem tudo a ver com o que vem sendo falado nessa disciplina, as escolhas e o processo de escolher, porém de uma maneira leve e agradável.

    Gostei do que você falou, ao dizer que "a não-escolha não é uma escolha possivel". Realmente, se tem uma coisa em que nós não podemos escolher é o não-escolher. Querendo ou não, estamos sempre fazendo escolhas em nossa vida. Até quando optamos por não agir, ficar parado, isso é uma escolha.

    Contudo, obviamente, por ser um poema, há um certo reducionismo em relação as escolhas. Na nossa vida, as coisas não se dão dessa maneira, ou "sim" ou "não", ou como no ditado popular, "8 ou 80".
    Fala-se muito da construção do processo de escolher, portanto, as escolhas nem sempre são obvias, claras, muito menos inatas, mas ao contrário, elas podem ser novas e construídas.
    Mas sim, é claro que ao escolher, estamos optando uma coisa, em detrimentos de outras.

    Herika Cristina da Silva

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  2. Muito bem colocado o fato de que a não-escolha não é uma escolha possível, até mesmo quando acreditamos que não estamos escolhendo por algo, isso já constitui uma escolha, então, olha ela aí sempre permeando nosso dia-dia... não importa se de forma sutil ou não, estamos a todo tempo fazendo escolhas, mesmo quando não refletimos que o são.
    Como disse a Herika acima, as coisas não são 8 ou 80... no entanto, pode ser uma escolha da pessoa só querer ou o sim ou o não, e deixar de escolher algo que se aproximasse mais do equilíbrio, este fato também depende do que se deve ser escolhido, da importância que tem para o sujeito que deve fazer a escolha... é algo totalmente singular.

    Marcelle Melo

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  3. Fiz um comentário nesse post que desapareceu. Enfim...

    Havia dito, dentre outras coisas, que esse poema pode ser um dispositivo muito interessante para as oficinas de Análise do Vocacional.

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  4. Concordo com vcs que sempre é preciso escolher... até mesmo a não-escolha já é em si uma escolha. Parece que sempre somos obrigados a nos posicionar, até mesmo quando não nos posicionamos... parece ser impossível não escolher entre ou isso ou aquilo, mas a questão que as vezes me levo a pensar é a seguinte: todos tem sempre isso e aquilo para escolher? Ou as vezes só há o isso, ou só o aquilo? É possível criar o isso ou o aquilo quando eles não existem? Não sei...

    Camila Machado

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  5. Boa noite meu caro.
    Gostei muito do poema e do seu blog, parabéns.
    Obrigado pela visita no meu blog e já estou seguindo o seu, se puder sigo o blog também.
    Abçs.

    http://devoradordeletras.blogspot.com/

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